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Setores afetados pelo tarifaço falam em quebra de empresas, paralisação e cortes

No setor calçadista, há empresas que dependem exclusivamente do mercado norte-americano. Na indústria nacional de pescados, 70% das vendas externas são destinadas aos Estados Unidos

O ‘tarifaço’ do governo dos Estados Unidos, oficializado em decreto assinado na tarde de quarta-feira, 30, por Donald Trump, foi recebido com alívio por setores da economia brasileira que entraram na lista de exceções que liberou da taxação mais de 700 itens, entre eles o suco de laranja, celulose e aviões. Porém, quem ficou de fora da lista fala em quebra de empresas, paralisação de linhas e em demissões. O início da vigência das tarifas foi prorrogado de 1º para 6 de agosto.

A Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados) avalia que a imposição de uma tarifa adicional de 40%, que se soma à de 10% anunciada anteriormente, vai "inviabilizar a venda para o mercado americano". Os EUA são o principal destino internacional do setor calçadista brasileiro, respondendo por mais de 20% do valor total gerado pelas exportações do setor. No primeiro semestre de 2025, o Brasil exportou aos norte-americanos US$ 111,8 milhões, equivalentes a 5,8 milhões de pares de calçados.

"Temos empresas cuja produção é integralmente enviada ao mercado externo, a maior parte para os Estados Unidos", afirmou a entidade em nota. Essas empresas, ainda de acordo com a entidade, "terão produtos muito mais caros do que os importados da China, por exemplo, que pagam uma sobretaxa de 30%".

No comunicado, a Abicalçados diz que a sobretaxa pode resultar na perda de 8 mil empregos diretos.

Máquinas e equipamentos - José Velloso, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), que representa um setor que exportou US$ 3,6 bilhões aos Estados Unidos no ano passado, também ficou de fora da lista de exceções. Ele fala que o setor dificilmente conseguirá redirecionar para outros mercados os produtos destinados à economia norte-americana.

Segundo Velloso, há especificações técnicas e normas específicas, como medidas em polegadas e peso em libras, diferentemente do sistema métrico utilizado em outros países. Essa particularidade dificulta a adaptação rápida para novos destinos, diz.

A sobretaxa para máquinas e equipamentos acontece mesmo com o Brasil sendo deficitário na balança comercial do setor. Em 2024, enquanto o Brasil exportou os US$ 3,6 bilhões aos americanos, o Brasil importou US$ 4,7 bilhões em máquinas, um déficit de US$ 1,1 bilhão para o lado brasileiro.

Café – Em comunicado, a associação da indústria de café, a Abic, informa que, com a postergação da vigência da tarifação para 6 de agosto, as negociações do setor para entrar na lista de exceções continuam. “Sabemos da importância do mercado norte-americano para o Brasil, mas também temos plena consciência da relevância do café para a economia dos EUA.”

Cerca de 99% do café consumido nos Estados Unidos é importado, sendo que o café brasileiro representa, aproximadamente, 34% do mercado norte-americano, diz a Abic, que reforça que 76% dos americanos são consumidores de café.

Além do Brasil, Colômbia, Vietnã e Honduras exportam café aos Estados Unidos, mas o tipo de café mais aceito pelo consumidor americano é o arábica, mais suave. Dos principais exportadores, apenas a Colômbia se destaca na produção desse tipo de café, mas em volume muito menor que o Brasil.

Tendo esses dados a favor, os produtores brasileiros dizem que “tanto atores nacionais – ministros, senadores, Itamaraty, setor produtivo – e, também, contrapartes americanas, seguirão negociando firmemente.”

Carne - A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec) estimou que o Brasil pode perder US$1 bilhão em vendas para os EUA com a sobretaxa de 50%.

A representante do setor destacou que nenhum mercado pode substituir imediatamente os EUA por causa do grande volume demandado pelos importadores e do preço que eles estão em condições de pagar. Os EUA ficam atrás da China em volume de compras neste setor.

Para este ano, as empresas brasileiras de carne bovina esperavam vender cerca de 400 mil toneladas ao mercado norte-americano, algo que agora parece inviável. "As fábricas já pararam de produzir as carnes especificamente para os EUA", afirmou o presidente da Abiec, Roberto Perosa.

Pescados – Também entre os setores taxados, a indústria brasileira de pescados, representada pela Abipesca, diz, em nota, que "o impacto será severo e imediato, com repercussões sociais e econômicas profundas, especialmente em regiões onde a atividade pesqueira é a principal fonte de emprego e renda."

Os pescados brasileiros têm o mercado norte-americano como destino de cerca de 70% das exportações. "Não há alternativas viáveis de mercado", diz a Abipesca. "Mais de um milhão de pescadores profissionais, além de milhares de famílias, serão diretamente afetados", informa a nota.

Posição do governo brasileiro

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva emitiu uma nota oficial, na noite de quarta-feira, em que defende a democracia e a soberania do país frente às iniciativas dos Estados Unidos contra a economia e a Justiça brasileiras. O comunicado destaca as iniciativas norte-americanas contra as instituições brasileiras e reforça que é injustificável o uso de argumentos políticos para validar as medidas comerciais anunciadas contra as exportações brasileiras.

"O Brasil tem acumulado nas últimas décadas um significativo déficit comercial em bens e serviços com os Estados Unidos. A motivação política das medidas contra o Brasil atenta contra a soberania nacional e a própria relação histórica entre os dois países", diz a nota assinada por Lula.

No comunicado, o presidente brasileiro aponta disposição para negociar apenas aspectos comerciais da relação com os Estados Unidos, sem abrir mão dos instrumentos de defesa do país previstos em sua legislação, como é o caso da Lei de Reciprocidade Comercial, além de um plano de contingência para minorar os impactos econômicos das tarifas.

"Nossa economia está cada vez mais integrada aos principais mercados e parceiros internacionais. Já iniciamos a avaliação dos impactos das medidas e a elaboração das ações para apoiar e proteger os trabalhadores, as empresas e as famílias brasileiras", conclui a nota oficial de Lula.

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